terça-feira, 20 de março de 2012

Cella, Xerife Nelson Cella

Sr. Nelson Cella: Quase um xerife de verdade. Com todas as suas responsabilidades e mazelas, não fica difícil encontrá-lo em alguns personagens de cinema da década de 30, por mais que, em 1950, quando Nelson completara apenas 8 anos, tivesse sido a primeira, de outras centenas de vezes em que ele pisaria dentro de um cinema.


Foto: Nina Pesce 
O senhorzinho de 70 anos, é de longe, se não o maior, mas um dos mais dedicados colecionadores de filmes e artigos relacionados ao cinema, de Piracicaba. Possuidor de um acervo de encher os olhos, que engloba filmes dos anos 20 até o começo da década de 90, ele tinha muito a me contar sobre a linha do tempo do cinema, sobre o cinema em Piracicaba, e principalmente sobre cinema western, estilo que para ele, marcou sua infância, e talvez sua vida.


Se imagine com 8 anos, na década de 50, quando os grandes ícones significativos para a sociedade passaram a ser criados na mídia de massa, a principio nas rádios, e logo após no cinema, e na televisão colorida, no mundo inteiro. Assim, formaram de vez a imagem do mocinho, e do vilão, com todos os seus aspectos particulares, em cores, voz,e no caso do cinema western, montados a cavalos, com pistolas e revolveres nas mãos, desprovidos do receio, transbordando adrenalina e ação para além do telão. Olhando por esse ângulo é possível compreender o que qualquer pessoa sentia quando via tudo aquilo.


 “Em Piracicaba, os filmes chegavam com certo atraso, mas pra mim, tudo se assemelhava”, Piracicaba realmente era o interior do Brasil naquela época, a cana de açúcar super em alta. “Meu pai andava a cavalo pela cidade, tinha uma charrete, eu trabalhava no campo”, sair do cinema e brincar de bandido e mocinho com arminhas de brinquedo seria inevitável, depois de uma sessão, “trabalhei desde pequeno para ajudar minha família, mas quase nunca tinha dinheiro para entrar no cinema, vendia balas, pirulito, gibi, o que fosse possível vender em frente ao Broadway, ou em frente do Cine São José, os dois únicos cinemas de Piracicaba na época, tudo para poder assistir a uma matine”.


Foto: Nina Pesce 
Os filmes no cinema da cidade, na época eram exibidos desta forma:Eram 3 filmes. Um de 1 hora, os chamados filmes B, um seriado de 30 minutos, e o filme principal de 1 hora e 30 minutos. “Filme B: Filmes de baixo orçamento, mas que ainda sim, eram ótimos, não ficavam muito atrás” disse enfatizando bastante este detalhe.


O tempo foi passando, e ele conquistou a profissão de Farmacêutico, e o dinheiro melhorou, pode passar a acompanhar mais os cinemas, e pode começar a comprar as revistas Cinemin, onde encontrou tudo o que lhe faltava, para compreender mais sobre os tais filmes do velho oeste, que tanto lhe empolgavam.
“Só depois de crescido pude saber das curiosidades e dos detalhes mais a fundo, de todos os filmes que já havia assistido quando criança, através dos magazines, e encontros com outros admiradores do cinema western”. Nestas revistas, era possível encontrar informações até mesmo sobre os bandidos do século XIX, que foram eternizados pelo cinema, como Billy The Kid, Jesse James, Jane Calamidade, e estes magazines divulgavam informações importantíssimas, até muito curiosas: “O pistoleiro mais famoso, Billy The Kid,que tinha como verdadeiro nome Willian
Bonney, foi condenado a morrer na forca, mas em 28 de abril de 1881 fugiu da prisão, 2 meses depois da fuga, novamente foi capturado, e foi morto em 14 de junho 1881, no Novo México, pelas mãos do Xerife Pat Garret”. Billy tinha 21 anos quando morreu, e matou 21 homens, sem contar com índios e mexicanos, um alto índice para a época.


Foto: Nina Pesce 
Foram eternizados pelo cinema também, personalidades como Audie Murphy,“Ele foi um soldado, que foi condecorado na guerra, ganhou varias medalhas, foi muito importante para os Estados Unidos, depois que voltou, fez um filme sobre a própria vida dele, antes da guerra, ele já era ator. Ele morreu em um desastre de avião, com pouco mais de 50 anos, novo, para quem até sobreviveu a uma guerra”. Personagens como estes, eram sensação na época, lendas vivas, o que colaborava desde o princípio com o marketing da soberania do exercito americano, visto até hoje nos filmes de Hollywood, mas segundo o Sr.Nelson, este tipo de influência não atingia os costumes do povo Brasileiro, porque afinal, estes filmes eram assistidos por puro lazer, diversão e entretenimento. Existe sim, uma grande diferença na forma em que, o cinema americano prioriza seu país nos filmes mundo a fora, da década de 50, para os dias de hoje. “Não, de forma alguma houve influência, porque no Brasil, existiam filmes que falavam da nossa cultura, como as historias dos cangaceiros e as chanchadas, que ai sim, retratavam o que nos importava, as pessoas quando assistiam os filmes americanos, era por puro lazer”,e ainda ressalta: “Sem contar que a qualidade dos filmes brasileiros era muito boa, em vários aspectos”.
Pedi para que ele me dissesse um ou dois artistas ou personagens preferidos da época, e porque não,especiais para ele até hoje, e ele logo me ditou: Charles Starret, interpretando Durango Kid em “O famoso Durango kid- Cavaleiro de druango” de 1940, e Johnny Mack Brown, interpretando Kid Carson, em um seriado de 15 capítulos, chamado “Sacrifico Glorioso” de 1933.


Todo este universo era composto por muita coisa, muita gente, muita arte, de bandidos reais, a policias e heróis de guerra, também reais, a músicos e compositores famosos da época, como Gene Autry, Smiley Burnette e Elvis Presley.
” Um comediante que se chamava Smiley Burnette, tocava todos os instrumentos, e era bom cantor, precisava ver rapaz”. Gene Autry também era excelente músico, começou sua fama nas rádios, e depois fez seu primeiro filme, chamado “O Cowboy Cantor” na década de 30, o que lhe rendeu muito reconhecimento na época, Elvis Presley que já estava na melhor maré que qualquer músico da época gostaria de estar, apenas aproveitou um pouco para alcançar mais destaque, além dos topos da parada das rádios, também as bilheterias dos cinemas, alguns dos filmes em que ele protagonizou, foram: Ama-me com ternura, Charro, e Estrela de fogo,neste filme,em especial, ele interpreta um índio.


Foto: Nina Pesce 
Sobre tudo, com o grande Xerife de Piracicaba, Nelson Cella, acredito que todos possam aprender que uma das artes que irá perpetuar por muitos séculos neste mundo, é o cinema, influenciando e emocionando multidões, marcando a historia das pessoas, muitas vezes, pela vida toda, com registros que apenas o tempo pode fazer com que sejam velhos ou não, mas que apenas nós podemos fazer com que sejam contemporâneos ou não, de acordo com nossas atitudes, e mudanças na sociedade, década após década.




Lucas Jacinto

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